Conheço várias
pessoas que temem falar em público, e alguns que tem dificuldades de se
expressarem através de palavras. Eu tenho uma dificuldade maior ainda, sou
incapaz de falar com o coração e quando faço falo com os olhos e não com os lábios.
A
racionalidade me fez um “ser frio e calculista”, que observar atentamente todos
os seus atos e seus passos. A vida me fez insensível e talvez incompreensivo,
entretanto não estou invulnerável aos descuidos e vacilos do coração.
Depois de alguns
anos trancafiados em um castelo construído com pedras retiradas das margens do
rio Aqueronte, onde a luz e os sentimentos apreciados pelos enamorados não me
atingiam eu fui descoberto.
Um simples
sorriso limou toda a escuridão que alimentava essa fortaleza, foi uma visita
celestial. A principio eu ignorei, abandonei essa possibilidade nas margens do desespero.
De nada me adiantaria mais uma ilusão, mais uma aventura. Entretanto Eros me
fez o favor de levantar a gigantesca porta de ferro que dava acesso a meu
mundo, ordenando a invasão do inevitável.
Aquele sorriso
brilhante composto de lábios adocicados pelas ambrosias dos Deus certa noite
aproximou dos meus que haviam sido mergulhados nas águas da angústia. Os olhos
se encontram, faíscas cruzam o ar e em um determinado instante fomos
paralisados pela dúvida do prazer passageiro que abre portas para a dor que
dificilmente nos abandona. Palavras de encorajamento saiam de meus lábios e o
encontro casual tornou-se puro e verdadeiro.
Minhas
muralhas começaram a ruir, minha esperança de solidão abrira espaço para um
sonho desconhecido. Deixei de ser Narciso e olhar para minha própria alma para
contemplar um sonho nunca desejado ou imaginado.
A felicidade e
a esperança caminhavam lado a lado rumo ao Elíseos. Porém as nuvens da
insegurança e da necessidade de partilha transformaram as tardes claras de sol
em noites tempestuosas de trovões.
Eis então que
começou a vingança do deus travesso do amor. E o que era imensidão tornou-se
apenas cárcere. Nesta prisão provei o sabor amargo da decepção e fui chicoteado
por palavras mais rígidas que a lamina da espada do guerreiro Gabriel capaz de corta o mal.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjQsr_V4DFvcUHeQiws_GiaUFO9QyWxoIgxL0UyliUnrtCwEXickcFEkniK94hjaDV_fL_XhZwY3n8RL0ax3y2LCr3hY2EZfmkp9NdAWwojR7Gx1kzcYZ8aeh49DfWDAyXJjKC0jmH-Ygs/s320/Eros_y_Psique_5.jpg)
Estou
abandonado às margens do Aqueronte de onde tirei pedras para levantar minha fortaleza impenetrável, isso tudo porque
Eros acreditou que o fato de eu construir essa muralha não me fazia invulnerável
e muito mesmo conhecedor do Tártaro.
Sei que não
sou tão corajoso como Psique para adentrar aos reinos dos mortos, mas sei que
sou capaz de sacrificar cada pulsar do meu coração por um sorriso teu.
Qual o homem que
nunca errou? Qual o homem que nunca se enganou ao confiar de mais? O dom do perdão
talvez seja maior que o do amor. Pois só é capaz de amar quem tem o dom de
perdoar.
Esperança é
muito mais que palavra é fé que tudo pode ser realizado. Nada é por acaso. Não
me arrependo de todas as vezes que demonstrei de formas humilhantes este amor
que um dia também desejou viver em meus braços frágeis. Ainda sinto o seu suspirar ofegante todos os dias quando apago as luzes e me abraço com a solidão que você deixou ao abrir as janelas e voar para seu reino em que sou apenas um observador calado.